Saiba como funciona cobertura de danos a terceiros quando causador comete infração de trânsito!
Nosso visitante Felipe nos enviou a seguinte questão:
“Olá Jessica, boa noite, tudo bem?
Eu me envolvi em um acidente de trânsito há uns dois meses, acionei o serviço da seguradora (cooperativa), somente para terceiro, como legalmente culpado pelo acidente. Levaram o carro do rapaz para uma oficina e depois de 40 dias disseram que não iriam cobrir mais o serviço alegando que depois da perícia por eu ter cometido uma infração de trânsito.
Sendo assim, tive que arcar com o prejuízo do conserto do carro do rapaz, que ficou em R$3.600,00.
No contrato do associado diz que o serviço para terceiros será realizado quando o associado for legalmente culpado, mas logo depois diz que se ele cometer alguma imprudência, negligência e etc, não cobre mais.
Seria um contrato abusivo, ou propaganda enganosa não?
Estou pensando seriamente em buscar uma forma de reaver este meu prejuízo na justiça, inclusive por danos morais.
O que vocês me indicaria?
No aguardo,
Felipe.”
Confira nossa resposta:
Olá Felipe, tudo bom?
As orientações que darei são referentes a contratos com seguradoras reguladas pela SUSEP. Como não atuamos com cooperativas ou associações de proteção veicular, não tenho acesso aos contratos e procedimentos de vendas para poder orientar.
Contudo, ao final menciono um pouco o que penso sobre seu caso.
Agravo de risco no seguro
No seguro existem situações que chamamos de “agravo de risco”. São ocorrências em que determinada atitude ou escolha do segurado faz com que o risco de sinistro aumente e, com isso, contribui para que o sinistro ocorra.
Exemplo 1: O exemplo que mais usamos no mercado é de alagamentos. Imagine que o segurado está dirigindo e se depara com uma área alagada. Se o veículo dele é “pego” pela enchente, não há agravo de risco, afinal ele não tinha o que fazer – portanto o seguro deverá cobrir.
É diferente de uma situação na qual ele está num local não alagado e, diante de uma rua alagada, tenta passar. Ao optar por “enfrentar” o alagamento, o segurado agrava o risco, pois as chances de sinistros aumentam em todos os aspectos: maior chance de perder o controle e colidir; maior chance de calço hidráulico; entre outros.
Agravo intencional
e não intencional de risco
No Exemplo 1 acima, temos um caso de agravo de risco intencional, pois o motorista tomou a decisão consciente de atravessar o alagamento. Portanto, ele assumiu o risco de atravessar o alagamento.
Agravo intencional de risco é aquela situação em que o segurado decide conscientemente tomar determinada atitude que aumenta o risco de dano ao bem segurado ou terceiros. Para evitar comportamentos desse tipo, todos os contratos de seguro de automóvel excluem cobertura para situações de agravo intencional de risco.
Porém, existem situações de agravo não intencional de risco. O segurado toma determinada decisão sem saber que está agravando o risco, mas ainda assim agrava o risco e acaba por sofrer ou causar um dano.
No Exemplo 1, seria o caso por exemplo de o motorista segurado estar dirigindo numa rua não alagada e, ao converter para uma rua transversal, cair numa área alagada. Ou ainda, quando ele vai no médico numa região que costuma alagar, mas até então não estava chovendo – quando choveu, alagou e o carro foi pego pela água. Em ambas situações o carro foi pego pelo alagamento por determinada decisão do segurado (virar na outra rua ou estacionar na rua ao ir no médico), mas nenhuma delas previa o alagamento ou implicou uma decisão em entrar no alagamento.
Situações de agravo não intencional de risco, na maioria dos casos, são consideradas acidentes e, nesse sentido, tem cobertura do seguro.
Há situações em que é difícil determinar se houve agravo intencional ou não intencional do risco, como é o caso de infrações de trânsito.
Infração de risco
é agravo de risco.
Toda infração de trânsito é agravo de risco, afinal, as leis de trânsito existem exatamente para impedir comportamentos de risco no trânsito.
Mas para efeitos do seguro, ainda vale o que descrevemos acima: agravo intencional ou não intencional.
Quando o sinistro com danos ao veículo do segurado ou a terceiros ocorre por infração de trânsito, a seguradora analisará as circunstâncias do acidente para entender o que aconteceu.
Se for constatado que ocorreu sinistro com infração de trânsito e que o motorista segurado estava conscientemente infringido as leis de trânsito, a negativa de cobertura é certa. Por outro lado, se for constatado que a infração de trânsito não foi intencional, ocorrendo por lapso, em princípio há cobertura.
Alguns exemplos:
Exemplo 2: Motorista segurado vira numa rua transversal, entrando na contramão, onde colide frontalmente com um carro que vinha no sentido contrário correto.
Se o motorista segurado que fez a conversão na contramão entrou ali por acidente, por exemplo porque não enxergou a placa que sinalizava a mão da rua, precisará deixar isso claro para ter cobertura. Já se entrou na contramão porque queria cortar caminho, estava com pressa ou algo assim, a seguradora negará cobertura.
Exemplo 3: Motorista segurado está num cruzamento onde a preferencial é dos carros que vem na outra via. Ao atravessar, ele colide com um carro que vinha nesta via preferencial.
Se o motorista estava dando a preferencial mas não viu ou não calculou bem o tempo para entrar na via, ele precisa explicar isso na descrição do sinistro, para que fique claro que ele respeitou a preferencial, mas a colisão ocorreu por um lapso ou acidente inevitável. Já se a seguradora constatar que o motorista entrou na via de forma imprudente, por conta e risco, poderá negar cobertura.
Situações comumente negadas:
Algumas situações já tem um certo “procedimento padrão” por parte das seguradora. É o caso de negativa de sinistros ocasionados por motorista segurado sob efeito de bebida alcoólica ou substâncias ilícitas; atravessar sinal vermelho; raxa ou competição não autorizada; dirigir em trilhas não autorizadas.
O que a jurisprudência
diz sobre isso?
Veja que a grande questão de cobrir ou não sinistros com infração de trânsito está na análise de se a infração foi intencional ou não. Isso faz com que cada caso seja um caso, dependendo muito da análise da seguradora sobre a motivação do segurado em determinada decisão.
Por isso, existem situações em que o segurado entende que a infração não foi intencional, mas a seguradora entende que foi intencional, negando cobertura.
A recomendação nesses casos é solicitar ajuda do corretor da apólice para conversar com a seguradora. Também recomendá-se olhar a jurisprudência de casos similares em sites de consulta, como por exemplo o Jusbrasil.
Cooperativas e associações
funcionam igual ou diferente?
Como ressaltei no início, não atuamos com cooperativas ou associações. Mas como uma orientação inicial, recomendo checar se a negativa deles se baseia nessa questão de agravo intencional e não intencional de risco.
Se a infração de trânsito não ocorreu por agravo intecional de risco, eu tentaria inicialmente conversar com eles para mostrar esse ponto. Se mantiverem a negativa mesmo assim, recomendo buscar uma Juizado Especial Cível (Pequenas Causas) ou diretamente um advogado.
Eles poderão lhe orientar sobre questões jurídicas, tais quais se cabe ou não danos morais, propaganda enganosa, entre outros.
Se for constatado pelo advogado que houve comportamento enganoso ou abusivo da cooperativa/associação em algum momento, além de buscar seus Direitos, recomendamos abrir denúncia na SUSEP e nos órgãos de defesa do consumidor.
Espero que essas informações ajudem de alguma forma!